
Participação no festival Delta Tejo em Portugal
05/07/2011 15:30Acabou há pouco mais uma edição do Delta Tejo. A noite de domingo foi a que registou maior adesão de público, apesar do tempo pouco veraneante, que não mobilizou grande consumo dos cocktails promovidos em todo o recinto por um dos patrocinadores deste festival de música lusófona.em um Ney Matogrosso menos exuberante que o daqueles tempos áureos de guarda-roupas faraónicas conseguiu passar discreto no Alto da Ajuda.
O espectáculo, de qualidade de topo, tinha como título Beijo do Bandido, e fazia de Ney um talentoso cantor de cabaret à frente de um quarteto de música de câmara, a elevar a altos patamares o MPB e a justificar porque é ele, ainda, um dos maiores ícones musicais do seu país. Cantou os temas publicados no álbum que dá nome ao espectáculo, como Fascinação (popularizado por Elis Regina), De Cigarro em Cigarro ou Bicho de Sete Cabeças.
Com um corpo invejavelmente jovem para um homem de quase setenta anos e uma voz abismal, Ney Matogrosso apareceu de casaco de cabedal e cachecol pretos, calças jeans e botas, fazendo movimentos de homem-morcego com aquele olhar de Nosferatu. Com uma maquilhagem menos extravagante que em tempos idos, mesmo que de olhos pintados, o cantor continuou provocante com aquela pose de toureiro afeminado, fazendo do simples despir de casaco um fevilhante strip-tease. Mesmo com a sensação de curto (pouco mais de uma hora), deu o melhor concerto do dia.
Antes, em alta, esteve também a jovem Maria Gadú, também promovendo o melhor do MPB, mas aqui com um motor mais pop-rockeiro. Com ar de menina e penachinho capilar, Gadú foi uma espécie de Cássia Eller mais adocicada, que cantou o incontornável Shimbalaiê para alegria das várias espectadoras às cavalitas que empunhavam a bandeira brasileira. 'Experimentalizou' o clássico Trem das Onze e converteu Ne Me Quitte Pas a uma espécie de cabaret dos trópicos. A ajudar a excelente actuação de Gadú esteve a sua banda, que soube salpicar perfumes de jazz (muitos deles vindos dos teclados) e que pôs a nu qualidades técnicas insuspeitas aquando do itinerário completo de solos instrumentais por todo o quinteto.
Com as desvantagens de ter abrir o dia no palco principal, o que os remete para a mera missão de aquecimento, os Expensive Soul tiveram a força alegre para contrariar o cinzentismo do manto de nuvens que cobria o céu com aquela grande festa afro-americana (salada quente de hip hop com romantismo soul, reggae e muito funk). A dupla dos óculos escuros (os vocalistas New Max e Demo) teve tempo para percorrer diagonalmente pelos três discos do grupo, incluindo, claro, Utopia e o seu Amor É Mágico, e para homenagear o falecido Angélico Vieira através das palavras de Demo - «ele gostava tanto de música como nós».
A fechar a noite estiveram os Parangolé, que tinham à sua espera uma tribo numerosa de brasileiros (quase todos bem atléticos). O concerto teve como meta única o abanão do corpo, através de ritmos nordestinos (e não só) afunilados por um contigente numeroso de bateristas e percussionistas à mesma técnica básica, enquadrável no axé. O altíssimo Léo Santana é o cantor e comandante de uma banda que incluía duas bailarinas e muita animação. Ou uma forma muito diferente de se ser brasileiro, daquela que Ney e Gádu nos tinham mostrado.
Na tenda do Palco Jogos Santa Casa, a grande actuação foi dos cabo-verdianos Ferro Gaita. Com uniformes das cores da bandeira do seu país, o septeto levou ao rubro aquele espaço junto à roda gigante do recinto, com um funaná contagiante - uma espécie de afropunk.
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